
Essa semana no hospital, eu e minhas alunas fizemos uma espécie de terapia de grupo, após atendermos nossa última paciente. Como vocês sabem, mesmo atendendo a quinze pacientes num período de quatro horas, eu faço questão de conhecer um pouco a vida das pessoas, e encorajo os pacientes a falar sobre suas famílias, sua vida em geral.
Essa última moça, nos contou que estava com a auto-estima lá no pé, porque tinha cinco anos que não se relacionava com ninguem. Desde que saiu de casa com a filha de nove anos, que havia sido molestada pelo pai, um cara que foi assassinado pouco tempo depois da separação de ambos por conta desse episódio, nunca mais ela confiou em homem algum. Ela já andava apanhando dele há alguns anos, mas o que aconteceu com a filha dela a fez tomar uma atitude.
Em um primeiro momento (de revolta normalmente), ao escutar essa história, nós pensamos e como somos humanos, julgamos a situação. É inevitável nos fazermos a seguinte pergunta: "Mas porque essa mulher aguentou durante tanto tempo? Porque não saiu de casa antes?".
Para quem está de fora, parece uma solução simples. Se o seu marido te bate, te xinga, você pega a criançada e vai embora de casa. Mas vai pra onde? E vai viver de quê? Não é fácil, gente!
Enquanto eu e as meninas conversávamos sobre essas questões, logicamente o papo tomou outra direção, e começamos a discutir nossos próprios relacionamentos. Ora, muitas mulheres já tiveram relacionamentos abusivos. Não necessariamente com tapas e socos, mas com agressões verbais, agressividade, ciúmes exagerados, gritos, escândalos, traições, humilhações.
Algumas vezes, esse tipo de relacionamento parece ser normal, mas de vez em quando o cara escorrega, e faz algumas coisas isoladamente, que te deixam na dúvida, sem saber se aquilo pode ser um comportamento com tendência a se tornar um evento repetitivo, ou se foi apenas um lapso.
Eu tive dois namorados idiotas, e com o tempo percebi que jamais conseguiria ser feliz ao lado deles. Não vou desperdiçar o tempo de vocês contando tudo o que sofri na mão desses dois diabos, mas vou contar como eu lidei com o problema.
Bom, primeiro, eu precisei perceber que existia um problema. Quando namoramos pessoas aparentemente normais, geralmente leva um tempo para eles colocarem as garrinhas de fora. Acontece uma crise aqui, outra ali, e nós vamos levando. Os amigos avisam, nós não escutamos porque estamos apaixonadas, temos a esperança de mudar a pessoa, ou pelo menos aparar as arestas, e o tempo continua passando.
Mas um dia, finalmente a ficha cai. Até porque, não somos idiotas. E não temos talento pra capacho. E aí, o que fazer?
Você ama o cara, mas percebeu que ele é um cafajeste, mentiroso, ------------ (complete as linhas com o adjetivo que mais se encaixar no seu caso).
No meu caso, eu respirei fundo e refleti que embora tenha me dado conta dos fatos, ainda não estava pronta para terminar com ele. Eu não acredito em ficar terminando e voltando, quando meus relacionamentos acabam, eu prefiro manter distância total. Até quando o cara é gente boa, ou gente ótima. Eu não acredito nesse negócio de ficar amiguinha de EX. Acho estranho. Admiro quem consegue. Claro que se a pessoa foi legal comigo, eu vou ser sempre cordial com ela quando encontra-la eventualmente na rua. Mas não vou ligar no aniversário, ir no churrasco, sair pra comer uma pizza...
Então eu fiz assim. Peguei minha agenda e abri em um dia aleatório. Nem olhei a data para não ficar presa a ela. Nesse dia eu escrevi assim:
"Se eu ainda estiver insatisfeita com Fulano, vou terminar com ele HOJE, sem dó nem piedade! E por telefone, que eu não preciso perder mais tempo com esse traste!"
O tempo passou e, lógico, chegou o dia. Era uma quinta-feira, nunca me esqueço. Eu estava na faculdade. Saí de lá, passei no shopping e comprei uma botinha preta, linda, pra criar coragem.
Cheguei em casa e o tolinho me telefonou. Segue o diálogo:
- Oi, Lu! Tudo bem?
- Tudo ótimo, melhor impossível.
- É? Porque? O que você fez hoje?
- Fui para a faculdade e quando saí de lá, comprei uma bota preta linda.
- Que legal! Então amanhã quando saírmos, eu vou ver se essa bota é bonita mesmo.
- Hum... não, não vai ver não.
- Não? Porque? Vai guardar pra usar em algum evento especial?
- Não, não se usa bota em evento especial. Vou usar amanhã mesmo quando eu for sair.
- Ué. Mas você não me avisou que ia fazer nada com os seus pais amanhã...
- E não vou fazer mesmo. Amanhã vou sair com os meus amigos da faculdade. SEM VOCÊ.
(na verdade, eu queria ter dito SEM VOCÊ OTÁRIO, mas como eu sou uma princesa... não pude. Mas pensei)
- Porque sem mim?
- Porque amanhã, na hora em que eu sair, você não será mais o meu namorado.
( Otário!!! Otário!!! Otário!!!)
O resto do papo vocês já imaginam.
Resumo da Ópera:
- Parem pra pensar se não estão em um relacionamento abusivo.
- Tomem coragem para terminar, mesmo que leve meses.
- Não tenham medo de ficar sozinhas. Sempre existe um sapato velho para um pé descalço. Como o príncipe de verdade vai poder entrar na sua vida, se você não consegue espantar a Fera?
- Uma vez tomada a decisão, não volte atrás. Os namorados abusivos ou psicopatas prometem mundos e fundos para que você não termine com eles. Isso não é amor por você, é que eles detestam ser descartados.
- Suma do mapa e não fique amiguinha de Ex. A não ser que esteja mal intencionada. Cuidado para não se machucar.
- Termine por telefone mesmo, porque um salafrário desses não merece ter o respeito de ser olhado cara a cara.
- De preferência, arrume logo outro. Nem precisa ser o cara CERTO. Afogue as mágoas com os errados mesmo. Eles existem pra isso, e estão fazendo a mesma coisa com você.
- Escute sua melhor amiga e a sua mãe. Principalmente a sua mãe. Se ela não gostou do seu namorado, geralmente existe um motivo razoável. Dificilmente as mães DAS MULHERES erram nessa questão.
- Não perca tempo com alguem que não vai te proporcionar um futuro emocionalmente ou fisicamente legal. Cada ano que perdemos com esses manés, consomem irreversivelmente nossa capacidade reprodutiva.
- Hoje é sexta-feira, gente! Um dia ótimo para se livrar de um namorado ou marido boboca e cair na gandaia.
obs. Esse post poderia se chamar "HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DE PRINCESAS: COMO A BELA BOTOU A FERA PRA CORRER"